Talles Lopes faz balanço de sua residência artística na Delfina Foundation, viabilizada por meio de parceria com o Instituto Inclusartiz
Leia abaixo entrevista com o artista goiano, um dos nomes mais promissores da arte contemporânea brasileira
Selecionado em 2021 para o programa de residências artísticas da Delfina Foundation, em Londres – fruto da sólida parceria de quatro anos entre o Instituto Inclusartiz e a instituição britânica –, o goiano Talles Lopes vem ganhando cada vez mais espaço na cena de arte contemporânea nacional. Indicado ao Prêmio PIPA deste ano, o artista disputou a vaga da Delfina Foundation com outros 140 inscritos na chamada aberta, realizada no ano passado, para talentos que vivem e trabalham na região Centro-Oeste do país.
>> Confira aqui o edital da open call da Delfina Foundation para artistas da região Sul do Brasil
Em sua produção, Talles parte da revisão de arquivos, atlas, projetos arquitetônicos e catálogos de exposições, com o intuito de investigar a paisagem construída na periferia do pensamento moderno no Brasil, bem como as suspeitas relações entre o imaginário de modernidade e as heranças coloniais. Nesta entrevista, ele faz um balanço de sua experiência na Delfina Foundation, conta um pouco de sua trajetória e revela alguns de seus projetos futuros.
Como você avalia a experiência no programa de residências da Delfina Foundation?
A Fundação Delfina propõe aos artistas um programa de residência focado no intercâmbio com a comunidade artística de Londres, de modo que o artista conheça, interaja e acabe por pensar junto com outras pessoas desse contexto. Isso me parece importante para provocar o residente a pensar conexões menos previsíveis, na medida em que essa interação o leva a estabelecer outros pontos de contato entre o universo familiar de seu próprio trabalho e a prática artística de pessoas com trajetórias, formações e circunstâncias diversas e/ou atípicas aos contextos brasileiros.
O que você aprendeu de mais importante durante a sua temporada em Londres?
Acho que o grande aprendizado foi perceber a importância de estar em permanente diálogo com outros trabalhadores da arte, escutando, observando e aprendendo sobre meu próprio trabalho a partir das críticas e perspectivas generosamente apresentadas por outros artistas, curadores, etc.
Você chegou a produzir alguma obra durante a residência ou foi mais pesquisa?
Dediquei meu período na Delfina para ampliar o campo de investigação relacionado ao meu trabalho. Faz alguns anos que me interesso em investigar como algumas noções de modernidade no Brasil se prestaram a atualizar heranças e estruturas coloniais. Mais recentemente passei a pesquisar como isso se desenrolou em publicações e exposições de arquitetura modernista brasileira, de tal maneira que, durante a residência, eu optei por pesquisar arquivos de exposições apresentadas em Londres ou na Europa que se propunham a explorar uma ideia de “Brasil moderno” por meio da arquitetura. Eu pude consultar arquivos como os da mostra “Brasilia: the building of a new capital for Brazil” (ICA, 1958) e as fotos do pavilhão do Brasil na EXPO 58 (Bruxelas, 1958) feitas por um correspondente da revista The Architecture Review que estavam disponíveis no arquivo da RIBA (Royal Institute of British Architects).
Como você está aplicando no seu trabalho, na prática, o que absorveu de aprendizado na residência? Já gerou algum resultado concreto?
Posso perceber que as questões que surgiram a partir da investigação, da consulta de arquivos e dos diálogos na Delfina, estão emergindo nos novos projetos que venho realizando recentemente, espero poder compartilhar mais sobre isso em breve. Ao mesmo tempo, ficou evidente que o acesso a alguns arquivos e materiais pode contribuir diretamente a trabalhos que vinham se desenvolvendo desde antes da residência.
Você afirmou em outra entrevista que não teve formação em artes visuais. Como tomou gosto pelo tema?
Sempre gostei de desenhar quando era mais moleque, e passei minha adolescência pintando na rua. Mais tarde, quando tive oportunidade de me aproximar do mundo acadêmico ao fazer uma graduação em arquitetura, me senti obrigado a ficar mais comportado em relação ao que vinha fazendo, ao mesmo tempo percebo que lá tive acesso a circunstâncias que me fizeram repensar e tomar mais gosto pela relação que eu tinha com as artes visuais até então.
Como você descreveria a sua produção artística?
Acho que talvez minha produção diga a respeito da genealogia de alguns signos relacionados a processos históricos de violência, muitas vezes investigando essa genealogia a partir do binômio moderno/colonial. Percebo que isso se desenrola pelo interesse em pensar como determinadas formas de violência veladas no campo da visualidade atualmente foram conscientemente produzidas e perpetuadas historicamente, havendo no trabalho uma necessidade de dissecar e compreender como essas coisas se esforçaram para nos alcançar no hoje. Acho que daí em diante eu vou procurando maneiras e mídias que me parecem coerentes para dar forma as questões que vão surgindo dessas indagações.
Você foi indicado ao Prêmio PIPA deste ano e está em plena ascensão. Você atribui um pouco do sucesso recente à iniciativa promovida pelo Instituto Inclusartiz?
Sinto que o trabalho e carreira de cada artista se mistura e se confunde com a trajetória dos parceiros encontrados nessa jornada, as oportunidades promovidas pelo Instituto Inclusartiz têm sido muito generosas e fundamentais nesse processo que é trabalhar com arte.
Quais projetos você tem pela frente?
Eu estou trabalhando em alguns projetos que foram pensados e elaborados a partir das minhas investigações durante a residência na Delfina Foundation. Um deles em específico é um projeto de múltiplo pensado e realizado em colaboração com o Instituto Inclusartiz, esse projeto explora materialidades e formas de fazer ainda novas pra mim, estou empolgado pra ver como a coisa toda vai se desenrolar.