28 de março de 2022

INSTITUTO INCLUSARTIZ APOIA EXPOSIÇÃO “A CASA É SUA”, NO PAÇO IMPERIAL

Em cartaz de 30 de março a 26 de junho, mostra com curadoria de Amanda Abi Khalil apresenta trabalhos de 19 artistas e coletivos nacionais e internacionais, bem como obras encomendadas para espaços públicos da cidade do Rio

Um dos principais fomentadores de arte contemporânea do país, o Instituto Inclusartiz está entre os apoiadores da exposição “A casa é sua: migração e hos(ti)pitalidade fora do lugar”, que leva ao Paço Imperial, a partir do dia 30 de março, obras de 19 artistas e coletivos nacionais e internacionais. A libanesa Amanda Abi Khalil, que participou do programa de residências do Inclusartiz em 2018, assina a curadoria da mostra, cuja programação inclui ainda trabalhos comissionados para espaços públicos da cidade do Rio de Janeiro.  

Os nomes escolhidos para emprestarem suas obras ao projeto, que também tem apoio do Goethe-Institut Rio de Janeiro, Delfina Foundation, International Studio & Curatorial Program (ISCP) e Open Society Foundations, são: Ahmad Ghossein (Líbano), Alexandre Canonico (Brasil/Reino Unido), Arjan Martins (Brasil), Ayla Hibri (Líbano), Bouchra Khalili (França, Marrocos), Daniel Steegmann Mangrané (Espanha/Brasil), Forensic Architecture (Reino Unido), Franziska Pierwoss (Alemanha),  Gabriela Bettini (Espanha), Gui Mohallem (Brasil), Khalil Rabah (Palestina), Laura Lima (Brasil), Louise Botkay (Brasil), Marcos Chaves (Brasil), No Martins (Brasil), Omar Mismar (Líbano),  OPAVIVARÁ (Brasil), Paulo Nazareth (Brasil) e Rayyane Tabet (Líbano). 

Os gregos antigos tinham seu conceito particular de hospitalidade contido na palavra xênia, no sentido da forma latina hospes, que significa, ao mesmo tempo, anfitrião, hóspede ou estranho. A noção de hospitalidade implica hostilidade, pois pressupõe a presença do “outro”, do “forasteiro”, do “estranho”, do “estrangeiro” ou do “hóspede”. Sendo assim, Jaques Derrida cunhou o termo “hostipitalidade”.

Em árabe, a palavra para hospitalidade é dayāfa, a virtude do acolhimento e da generosidade, amplamente descrita na poesia pré-islâmica (Al Jahiliyya) e enraizada nas práticas beduínas que atenuavam as difíceis condições de vida do deserto para o “viajante” ou o hóspede.

O orgulho dos árabes pela prática da hospitalidade reside no dever e na honra: diz-se que o anfitrião deve receber e alimentar o hóspede por três dias e três noites; depois desse tempo, sua obrigação está cumprida e é pedido ao visitante que “faça de conta que a casa é sua”. 

A casa é sua: migração e hos(ti)pitalidade fora do lugar é o componente da exposição de uma troca multicultural Sul-Sul que vem ocorrendo desde 2017, principalmente entre Líbano e Brasil. 

O projeto volta seu olhar para a hospitalidade e as tensões nas relações hóspede-anfitrião do ponto de vista dos modos históricos e contemporâneos de migração específicos para esses dois contextos globais do Sul e que repercutem com práticas xenófobas globais mais amplas em relação ao “outro” que não é apenas o refugiado ou migrante.

A metodologia da exposição sempre pretendeu ser sensível ao contexto e, desde 2017, foi imbuída e atravessada por diversas tragédias, por agitações políticas, que causaram seu primeiro adiamento, e, depois, por uma pandemia, que resultou em uma segunda prorrogação. Durante esse tempo, o projeto conseguiu formular dois gestos radicais de hospitalidade:

O primeiro foi uma residência de ajuda emergencial, A casa é sua: práticas radicais de cuidado e hospitalidade, na esteira da explosão do porto de Beirute, em outubro de 2020, em colaboração com a Kaaysá art residency, em Boiçucanga (São Paulo), que recebeu sete artistas impactados pela explosão e necessitados de um refúgio seguro para se recuperarem tanto fisicamente como psicologicamente. Essas cinco semanas de convivência geraram diálogos críticos sobre a prática da hospitalidade radical em tempos de crise extrema, suas problemáticas e limites, dos quais participaram muitos dos artistas brasileiros envolvidos na exposição e outros colaboradores, com visitas pontuais e apoio, como Patrick Pessoa (filósofo e escritor), Tania Rivera (curadora e psicanalista), Denise Portinari (psicanalista), Hena Lee (curadora), Gui Mohallem (artista), Marcos Chaves (artista), Isabella Rjeille (curadora), Bianca Bernardo (curadora), Gabriel Bogossian (escritor e curador), entre outros. 

O segundo aconteceu em junho de 2021, quando a pandemia assolava o Brasil e o número de moradores de rua aumentou dramaticamente no Rio de Janeiro. O acesso a água foi e continua sendo uma emergência. Como parte do projeto A casa é sua: migração e hos(ti)pitalidade fora do lugar e para atender a necessidade urgente de acesso a água, foi feito um convite ao coletivo de arte OPAVIVARÁ!. Bem Comum, uma fonte pública móvel, que agora encontra seu lar no pátio do Paço Imperial, foi ativada como intervenção durante vários fins de semana, percorrendo as ruas do Centro do Rio de Janeiro e distribuindo água aos moradores de rua, ao longo do caminho de fontes inativadas, como o Chafariz do Mestre Valentim.  

As formas como esse projeto vêm possibilitando a permeabilidade e a transformação para responder às atuais questões políticas, necessidades sociais e temas prementes relacionados à hospitalidade é um experimento de natureza curatorial que posiciona a exposição em si como anfitriã e como hóspede em relação ao contexto em que está ocorrendo. 

As obras existentes e comissionadas para a exposição tratam do tema da migração, entendida como forma de movimento, deslocamento, fluxo, ocupação ou transferência voluntária ou forçada de pessoas, espécies e outros corpos e materiais animados ou inanimados, revelando tensões aparentes ou interpretativas de hospitalidade, que podem ser interpretadas de modo formal, conceitual ou discursivo. 

A casa é sua: migração e hos(ti)pitalidade fora do lugar traz à tona temas que desafiam ideias ocidentais equivocadas sobre hospitalidade e as relações hóspede-anfitrião quando aplicadas a contextos como os do Brasil, do Líbano, da Palestina ou do Caribe, por exemplo. 

A instituição que abriga a exposição, o Paço Imperial – uma construção emblemática da história do Rio de Janeiro, onde a família real portuguesa fixou residência temporária, sentindo-se em casa, é também o local em que foi assinada a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil. A casa é sua convida o público a transformar o espaço da exposição em lar temporário, onde afeto e relações possibilitam o surgimento de imaginários e gestos radicais. Onde desejos por quilombos e pela convivência com o “outro” se manifestam.